ATA DA SEXTA SESSÃO ESPECIAL DA TERCEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA LEGISLATURA EM 11.11.1991.

 


Aos onze dias do mês de novembro do ano de mil novecentos e noventa e um reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Sexta Sessão Especial da Terceira Sessão Legislativa Ordinária da Décima Legislatura, destinada à entrega do Título Honorífico de Cidadão Emérito ao Senhor Alejandro Lilienthal e receber os participantes do Congresso Latino-Americano de Congregações Judaicas Liberais e Reformistas, como solicitado pelo Projeto de Resolução nº 120/91 (Processo nº 1054/91), de autoria do Vereador Nelson Castan. Às nove horas e quarenta e um minutos, constatada a existência de “quorum”, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos e solicitou aos Líderes de Bancada que conduzissem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a Mesa: Vereador Omar Ferri, 2º Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, Presidente em exercício; Senhor Adido Comercial do Consulado do Uruguai, representando o Cônsul, Senhor Gonzalo Ferreira; Senhor Hugo Nudelmann, Presidente da SIBRA; Senhora Jaques Bacaltchuk, Presidente do Instituto Cultural Marc Chagall; Senhor Israel Lapchik, Presidente do Conselho da Federação Israelita do Rio Grande do Sul; Senhor Cláudio Nhuch, Secretário do Movimento Juvenil Chazit Hanoak; Senhor Rabino Alejandro Lilienthal, Homenageado, e Vereador Nelson Castan, Secretário “ad hoc”. A seguir, o Senhor Presidente fez pronunciamento alusivo à solenidade e concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Vereador Nelson Castan, em nome das Bancadas do PDT, PMDB e PL, reportou-se sobre o Homenageado, dizendo que o mesmo trouxe os ideais de um judaismo contemporâneo que em muito tem apoiado e auxiliado a comunidade judaica a compreender a si mesma, ressaltando seu trabalho orientado à juventude. O Vereador João Dib, em nome da Bancada do PDS, congratulou-se com o Homenageado, mencionando que o Rabino Alejandro Lilienthal dedicou sua vida à propagação da sua religião e que o homem sem religião não vive bem. Afirmou, ainda, que a missão escolhida pelo Homenageado é a de unir todos, de conservar os princípios religiosos, o que é algo excepcional. Após, o Senhor Presidente concedeu a palavra ao Senhor Alejandro Lilienthal, que agradeceu o Título recebido, ressaltando a atuação das Sinagogas e da vocação do povo judeu como divulgador da totalidade divina. Pediu licença para homenagear os ex-Presidentes responsáveis pela trajetória da comunidade ao longo de seus cinqüenta e cinco anos de história, fazendo a entrega de símbolos de reconhecimento a diversos representantes. Em continuidade, o Senhor Presidente convidou a todos para, de pé, assistirem à entrega do Diploma ao Senhor Alejandro Lilienthal, feita por Sua Excelência. Às dez horas e vinte e sete minutos, nada mais havendo a tratar, o Senhor Presidente agradeceu a presença de todos e, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de hoje, à hora regimental, declarou encerrados os trabalhos da presente Sessão Especial. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador Omar Ferri e Secretariados pelo Vereador Nelson Castan, Secretário “ad hoc”. Do que eu, Nelson Castan, Secretário “ad hoc”, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelos Senhores Presidente e 1º Secretário.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Omar Ferri): Damos por abertos os trabalhos.

Senhores e Senhoras aqui presentes, Exmo Sr. Rabino Alejandro Lilienthal, muito bom dia. Na qualidade de Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, estando atualmente em exercício da Presidência dos trabalhos e tendo em vista que o Ver. Antonio Hohlfeldt afastou-se da Cidade e o Sr. Vice-Presidente assumiu o cargo de Prefeito Municipal, eu, com muita honra, presido esta Sessão Solene de hoje, promovida por esta Câmara de Vereadores para homenagear o Sr. Alejandro Lilienthal.

O Ver. Nelson Castan, aqui presente, requereu através do Proc. nº 1054/91, PR nº 120/91, que fosse concedido o título honorífico de Cidadão Emérito ao Sr. Alejandro Lilienthal. Este Projeto foi aprovado por unanimidade pelo conjunto dos Vereadores que compõem o Legislativo de Porto Alegre.

Falarão em nome da Câmara Municipal: em primeiro lugar, o Vereador proponente, Nelson Castan, que falará em nome das Bancadas do PDT, do PMDB e do PL; falará também, em nome do PDS, o Ver. João Dib.

De minha parte, gostaria de dizer três palavras ao ilustre homenageado, e as direi com muita satisfação. Conheço há bastante tempo, tanto desta Casa como de outras atividades políticas e sociais, dos meios de comunicação, que se há alguém nesta Cidade que realmente mereceu, mercê de seus esforços, de suas atividades, de seus ideais e de sua luta por um mundo melhor e por um mundo onde haja mais compreensão entre os homens, sem dúvida alguma, esta manifestação de louvor e de aplauso dos 33 Vereadores desta Casa, esta pessoa é o nosso ilustre Homenageado.

Coube a mim a sensível e gloriosa tarefa de representar o Legislativo. Faço isso com muita honra e muito gratificado por esta coincidência de me ter conduzido à Presidência dos trabalhos nesta manhã ensolarada e primaveril de hoje, e dizer que lhe dou um abraço com muita satisfação, pois estou vibrando, porque um amigo meu mereceu, legitimamente, este voto de Cidadão Emérito de Porto Alegre. E haverá sempre de ser um símbolo a lhe guiar, a iluminar pelo resto de sua vida, esparramando também as palavras judiciosas que são nossas e que a comunidade israelita de Porto Alegre sempre tem para seus membros. Meus parabéns. (Palmas.)

A seguir, usará da palavra o Ver. Nelson Castan, requerente desta solenidade, cujo pronunciamento será em nome do PDT, do PMDB e do PL.

 

O SR. NELSON CASTAN: Ver. Omar Ferri, Presidente em exercício desta Sessão Especial, destinada a homenagear o querido Rabino Alejandro nosso homenageado especial na manhã de hoje. Inicialmente, minha homenagem especial aos participantes do Congresso Latino-Americano de Congregações Liberais e Reformistas que a Câmara Municipal recebe hoje, num momento muito importante para esta Casa.

(Lê.) “O Rabino Alejandro Lilienthal é hoje um dos porta-vozes mais avalizados da comunidade judaica de Porto Alegre e do Rio Grande do Sul. Nascido no dia 27 de novembro, em Montevidéu, Uruguai, formou-se na Escola de Rabinato da Hebrew Union, onde obteve o título de Mestre de Artes em Letras Judaicas. Foi professor visitante do Departamento de Ensino de Ciências do Instituto Weizmann, em Israel.

Em Porto Alegre, o Rabino Lilienthal desenvolve atividades na sinagoga da SIBRA, na Avenida Mariante. Sua vinda foi co-patrocinada por esta instituição e pelo Instituto Cultural Judaico Marc Chagall. Além da formação religiosa, Alejandro Lilienthal atuou como comentarista de basquete na Rádio Estatal Uruguaia e graduou-se em Química em Montevidéu.

Na congregação onde atua, tem priorizado o trabalho de renovação e estruturação, sempre visando à modernização e ao congraçamento de esforços. Entre os projetos implementados com sucesso, destaca-se o Centro de Estudos Judaicos, que, em conjunto com o Instituto Marc Chagall, tem oportunizado a judeus e não-judeus conhecerem e aprofundarem os aspectos vários do mundo espiritual e cultural judaico.

Ideologicamente, o Rabino Alejandro é identificado com a corrente reformista judaica. Nascida nos Estados Unidos como uma interpretação contemporânea dos valores judaicos, ela tem atualmente milhares de adeptos em todo o mundo. O reformismo é uma alternativa progressista e inovadora, que busca dar um sentido atual à milenar cultura hebraica.

É justamente por isso que uma das áreas de atuação de maior ênfase e repercussão do Rabino Lilienthal é a das relações inter-religiosas. Esse processo teve início em 1989, quando o Pastor Hans Spring, da Igreja Luterana, participou, na SIBRA, da Conferência ‘Os Dez Mandamentos na Visão Judaica e Cristã’. Em 1990, o Padre Guido Klein, encarregado da CNBB para assuntos econômicos da Região Sul, foi o primeiro clérigo cristão a ocupar o púlpito de uma sinagoga no Rio Grande do Sul. Essas relações têm se estreitado cada vez mais, através de encontros, seminários e participações em atos ecumênicos de toda espécie.

Alejandro Lilienthal tem participado como convidado em inúmeros programas de rádio e televisão, sempre representando a comunidade judaica. Escreveu, dentro do mesmo espírito, artigos publicados no Jornal Zero Hora.

Acreditamos que esta homenagem que ora propomos é, além de um reconhecimento ao trabalho realizado em Porto Alegre pelo Rabino Alejandro Lilienthal, um incentivo ao diálogo ecumênico orientado para a busca de valores e raízes comuns, sempre buscando a harmonia e a convivência fraterna entre os vários segmentos da sociedade porto-alegrense. Pretendemos, da mesma forma, salientar o desprendimento e a visão da sinagoga da SIBRA e do Instituto Marc Chagall, responsáveis diretos pela permanência de Alejandro Lilienthal em nossa Cidade.”

O que acabei de falar foi a Exposição de Motivos aposta ao Projeto de Resolução de nossa autoria, aprovado pelos Vereadores desta Casa, que concedeu o título de Cidadão Emérito de Porto Alegre ao Rabino Alejandro Lilienthal. Esta é a primeira vez que Porto Alegre homenageia um religioso judaico. Sinal dos tempos, bons tempos. Alejandro trouxe consigo os ventos da renovação, os ideais de um judaísmo contemporâneo que em muito tem apoiado e auxiliado a nossa comunidade judaica a compreender a si mesma, integrando-a mais e mais na sociedade mais ampla em que vivemos e valorizando-a aos olhos desta sociedade.

Do muito que Alejandro já fez pela sua gente local, é de se ressaltar o seu trabalho orientado à juventude. Pode-se dizer, sem medo de excessos, que Alejandro conseguiu algo que é preocupação permanente: a volta dos jovens à sinagoga. Afinal, ele é um jovem que, com seu estilo de liderança comunitária mais aberta e menos dogmática, muito sincera e objetiva, consegue manter um diálogo que inspira confiança e transmite afeto. Isso tranqüiliza o jovem, dá-lhe segurança e o mantém ligado a sua sinagoga e a sua comunidade.

A verdade é que Alejandro Lilienthal, apoiado na profunda convicção de seus pensamentos, tem conseguido abrir seus espaços, seja no âmbito da própria comunidade judaica, seja na sociedade mais ampla em que vivemos. Homem de personalidade firme e valores honrados, é ouvido e respeitado pelas demais lideranças. Suas opiniões representam balizamentos importantes em inúmeros foros internos e externos, seja na própria orientação religiosa, seja nas mais diversas manifestações culturais em nossa Cidade.

Por tudo isso e muito mais é que a Câmara Municipal de Porto Alegre torna o Alejandro, a partir de hoje, um Cidadão Emérito da nossa Cidade. Alejandro, um abraço. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Concedemos a palavra ao Ver João Dib, que falará em nome da Bancada do PDS.

 

O SR. JOÃO DIB: Sr. Presidente, meu caro Rabino Alejandro Lilienthal, meu Senhores, minhas Senhoras, eu poderia perfeitamente ficar numa pequena frase, já que aqui estão admiradores, amigos e familiares do nosso homenageado. Eu poderia dizer que tudo que foi lido na Exposição de Motivos e no discurso do Ver. Castan resume a personalidade do Homenageado, que tem todo o nosso carinho, mas entendo que devo dizer algumas palavras mais.

Cidadão Emérito é, no meu entendimento, o título mais alto que esta Câmara outorga. É um entendimento pessoal, mas que é capaz de facilmente ser justificado, porque emérito é insigne, alguém que faz elite e não é apenas mais um cidadão, é cidadão emérito, e cidadão emérito de uma cidade maravilhosa como é Porto Alegre. É claro que o nosso novo Cidadão Emérito poderia – à semelhança de Sócrates, que perguntado qual a sua origem, respondeu: “Não sou de Atenas, não sou da Grécia, sou do mundo.” E o nosso Alejandro Lilienthal pode dizer: “Eu sou um rabino. Portanto, até por isso eu sou do mundo.” Mas Porto Alegre também é um pedaço, e um pedaço importante, do mundo, e esta Cidade disse que ele é emérito, reconheceu qualidades que ele nega ter, diz não ter, mas que realmente tem.

Ele é um homem que dedicou a sua vida à propagação da sua religião, e o homem sem religião não pode viver. Aquele que é feliz precisa da religião para que ele não faça excesso, para que ele seja reprimido; aquele que não é tão feliz precisa da religião para que ele não perca a esperança. Então, a religião deve unir todos, e a missão escolhida pelo nosso homenageado, de levar sua religião, de conservar os princípios religiosos, é algo excepcional, e por isso eu o cumprimento, também.

O Ver. Castan colocou quase todas as qualidades. Talvez tenha sido um pouquinho modesto, talvez alguns dos Senhores possam acrescentar muito mais. Mas uma coisa é certa: todos nós gostamos muito dele. E eu aprendi a gostar dele. E vou encerrar minhas palavras com as palavras que o ouvi dizer, saídas do fundo do seu coração. É assim que as palavras deveriam sair sempre, não apenas serem pronunciadas. Deveriam ter sentimento, deveriam ter alma. E ele, num programa de televisão, ele encerrava um pequeno debate, e ele dizia: “Paz, salan, shalon”. Muito obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Eu vou me permitir, antes de passar a palavra ao Rabino Alejandro, ler o Parecer prolatado pela Comissão de Justiça e Redação, de nº 283/91. (Lê o Parecer.) Para minha honra, o Ver. Omar Ferri foi o relator. Assinaram o presente Parecer os Srs. Vereadores Vicente Dutra, Leão de Medeiros, João Motta, Elói Guimarães e Isaac Ainhorn.

Agora, tenho a honra de passar a palavra ao Homenageado, Sr. Alejandro, que falará em seu nome e em nome do Congresso Latino-Americano de Congregações Judaico-Liberais.

 

O SR. ALEJANDRO LILIENTHAL: Exmo Sr. Ver. Omar Ferri, Presidente em exercício da Câmara Municipal de Porto Alegre, prezados amigos, presentes em Porto Alegre para o nosso 4º Encontro de Congregações Liberais Reformistas da nossa América, prezados colegas representantes das instituições judaicas da nossa comunidade, amigos, Senhoras e Senhores.

(Lê.) “É difícil verbalizar emoções, é difícil expressar em palavras o que se sente em um momento assim. Discursar perante os representantes eleitos por um número tão significativo de pessoas como a população de Porto Alegre é um privilégio e uma honra. Vem a mim nesta oportunidade a exclamação do patriarca Jacó no livro de Genesis (28:17): “Que impressionante é este lugar!”.

A vida transcorrida até agora passa diante dos olhos, permitindo rever episódios, lembranças e sentimentos. Os dias como professor no Uruguai, a atividade de radialista, os estudos rabínicos, a formatura e a ordenação, o tempo em Porto Alegre até o dia de hoje. Dia que ficará na memória, tanto quanto a noite de novembro de 1980, quando, microfone em mãos, subi as escadarias do prédio do Parlamento Uruguaio para obter os primeiros resultados do plebiscito constitucional onde o Governo ditatorial foi derrotado nas urnas pelo povo. Que momento sublime, aquele! Que momento maravilhoso, este!

Devo confessar que quando soube da proposição feita para me conferir esta honra, e especialmente quando ela foi aprovada por esta Casa, minha primeira reação, salvando as infinitas distâncias, foi semelhante à dos profetas, que inicialmente se escondem do chamado divino: “Ah, Senhor, eis que não sei falar, porque sou ainda uma criança.” Jeremias (1:6) “Por que eu?”, dizia o profeta. “Por que eu?”, me pergunto. A resposta deve estar na trilha pela qual tem transitado meu trabalho, e também o de muitas outras pessoas: o indivíduo isolado nada faz.

O caminho começou há alguns anos, quando o Instituto Cultural Judaico Marc Chagall e a SIBRA tiveram a iniciativa de criar, para a comunidade judaica de Porto Alegre, uma alternativa em matéria de questões religiosas. Iniciou-se, desta maneira, a era das diferentes linhas ideológicas judaicas em Porto Alegre. Ao lado desse objetivo existia o desejo de preencher um espaço, o espaço que uma sociedade democrática e pluralista guarda para qualquer segmento que traga contribuições para o mosaico da comunidade maior. Depositários de uma tradição milenar, certamente temos o que dizer, certamente temos o que mostrar. Sem triunfalismos nem absolutismos, mas com profundo senso de autenticidade. É devido a esse princípio básico que minha sinagoga tem as portas abertas de par em par, para todas as pessoas de boa vontade que desejem informação ou vivência judaica. O cuidado que sempre tomamos: respeitar a dignidade da pessoa que vem a nós, judia ou não; respeitar sua independência e sua liberdade de juízo.

Cursos, palestras, serviços religiosos e contatos pessoais sucedem-se no nosso prédio. Aqueles que, sendo diferentes de nós, nos honram com sua presença e interesse, premiam-nos com o belo e digno que cada ser humano traz consigo. É por causa desse princípio básico, também, que este Rabino tem feito ouvir sua voz sempre que solicitado, abordando não somente temas de interesse específico da comunidade judaica, como uma festividade do calendário ou os problemas do Oriente Médio, mas também temas de interesse universal, como a pena de morte ou os problemas do casamento e da família.

Penso, contudo, que esta forma peculiar de agir não é – nem deve ficar – restrita a judeus, nem especificamente a este ou outro rabino. Acredito que esse procedimento deve ser de todas as comunidades e, especialmente, de todos os clérigos. Existe, presentemente, uma tendência que quer limitar o âmbito de ação do clérigo às paredes da sua casa de oração, seja igreja, seja sinagoga, grande ou pequena. Nosso raio de ação é cerceado por muitos, dentro das nossas próprias comunidades, aos detalhes do ritual. Freqüentemente, uma incursão em esferas mais amplas provoca reação. Alega-se que estamos virando políticos: nada mais errado, nada mais falso. Contanto que não transformemos nossos púlpitos em palanques eleitorais, não estaremos fazendo política, mas sendo fiéis a um dos aspectos fundamentais da nossa vocação.

Se tomamos o texto bíblico como parâmetro de reflexão, encontramos nele uma profusão de determinações e regras relativas ao âmbito ritual: “Quando um  de vós apresentar uma oferenda a Adonai, podereis fazer essa oferenda com animal grande ou pequeno.”  Levítico (1:2) Na vivência religiosa das nossas comunidades, enfatizamos o ritual. Ele tem muita força, é verdade; o ser humano necessita dele. Em batizados, bar-mitzvah, comunhões ou casamentos, liturgias e jejuns, o ritual sempre está presente.

Mas não esqueçamos o chamamento que, entre outros, nos faz o profeta Isaías, em um trecho que no nosso caso a tradição manda ler no Iom Kippur, o Dia do Perdão: “Por acaso não consiste nisto o jejum que escolhi, em romper os grilhões da iniqüidade, em soltar as ataduras do jugo, em pôr em liberdade os oprimidos e despedaçar todo o jugo? Não consiste em repartires o pão com o faminto, em recolheres em tua casa os pobres desabrigados, em vestires aqueles que vês nu e em não te esconderes daquele que vês nu?” Isaías (58: 6-7) O clérigo que só se manifesta a respeito do ritual esquece a dimensão das relações entre os seres humanos, a dimensão social. O clérigo que emite opinião em relação aos fatos da rua, ao dia-a-dia, não está fazendo nada além de sua obrigação de ser o porta-voz da tradição que ele representa, lembrando aspectos freqüentemente esquecidos, muito provavelmente pela incomodação que causam nas consciências dos ouvintes.

Mas, junto com as relações do ser humano com seus semelhantes, existe outra tarefa, especialmente importante contemporaneamente. O clérigo deve pregar utopias. Nesta época de transformações e reordenamentos, existem aqueles que proclamam a viva voz o fim de certos esquemas e modelos, confundem ideologias com algo que não é patrimônio de nenhuma coletividade política: a capacidade de sonhar, a capacidade de aspirar e chegar a estágios mais desenvolvidos do existir humano. Dentro do mundo judaico, tomemos o exemplo de Maimonides, o genial mestre da Idade Média espanhola, que em seu código de leis descreve como será o mundo vindouro, segundo sua ótica: “E naquele momento não existirá nem fome nem guerra, nem inveja nem competição, porquanto a bondade estará espalhada livremente e a sensibilidade existirá em abundância que nem o pó, e a humanidade não terá outra ocupação a não ser conhecer o Senhor.”, Mishne Torah, Hil Melachim, 12:5.

Aquele que se conforma com a realidade, que – pior ainda – acredita ter chegado ao fim da evolução, não só está errado: é pobre espiritualmente. Eis aí a nossa função: sermos divulgadores da totalidade da mensagem divina, cada um da forma particular, como os ouvidos históricos têm conseguido entender a misteriosa voz que vem desde os primórdios do existir. Particularismos à margem – e eles existem e devem continuar existindo –, são estes os pontos básicos que, a meu ver, todos temos em comum. Sobre esta base poderão ser encontradas divergências e coincidências, quem sabe não é este o aporte maior que o diálogo inter-religioso tem a dar ao momento brasileiro? Se os púlpitos conseguem encontrar coincidências, por que não outros setores da sociedade?

Sr. Presidente, Srs. Vereadores, tudo que acabo de enumerar é muito mais do que tenho feito. Quem sabe, voltando ao exemplo do profeta, eis aí onde a distinção que me é conferida hoje se transforma em desafio: “Mas Adonai me disse: ‘Não digas eu sou ainda uma criança, porque a quem eu te enviar, irás, e o que eu te ordenar, falarás.’.”, Jeremias, 1:7. O Título de Cidadão Emérito se transforma em uma voz que me diz: “Tens feito. Podes fazer mais. Faz!”. Só posso responder: com todas minhas forças, vou tentar.”

Sr. Presidente, peço licença para prestar uma homenagem aos ex-Presidentes responsáveis pela trajetória da comunidade ao longo dos seus 55 anos de história. Peço a gentileza de chamar os homenageados para que recebam o símbolo do nosso reconhecimento. Obrigado.

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Pois não. Chamaremos, agora, os homenageados: Eduardo Hess, em memória do Dr. Samuel Hess; Drª Nina Caro, em memória do Dr. Herbert Moritz Caro; Hans Kurt Cassel, em memória do Sr. Léo Lemchen; Lieselotte Stiefel, em memória do Sr. Curt Stiefel; Renata Lehmann, em memória do Sr. Alfred Otto Lehmann; Herbert Lewinsohn; Erwin Bendheim; Ellen Neu Wiener, em memória do Sr. Kurt Wiener; Klaus Oliven; Dr. Cláudio Henrique Wolff; Henrique Dreyfus; Hernesto Thalheimer; Abraham Merel; Sergio Lewinsohn; Dr. Jorge Miguel Heineberg; Mario Caspary; Hugo Daniel Nudelmann.

A Presidência dos trabalhos comunica a presença, em Plenário, do Ver. Isaac Ainhorn, do PDT. (Palmas.)

Neste momento, a Mesa vai proceder à entrega do título honorífico de Cidadão Emérito de Porto Alegre ao Sr. Alejandro Lilienthal. No entanto, a Mesa não foge de dizer ainda duas ou três palavras. A Mesa acompanhava atentamente o pronunciamento de V. Exª, e, quando ouvia, lembrava-se de um episódio ocorrido há muitos anos num concurso internacional de violão promovido pela Faculdade Musical Palestrina de Porto Alegre, em que exímios apresentadores esgrimiam seus vilões e conquistavam os primeiros lugares. E o diretor chegou ao meu ouvido e disse: “Ferri, observa como aquele cidadão toca a nota redondinha.”. Eu lembrei-me deste termo, redondinha, e observei suas palavras corretas, apropriadas, concretas, claras, francas e sem desvios. De tal maneira que eu anotei que o Senhor é um grande político sem fazer política, é um grande religioso sem ser místico, e tem um profundo carisma sem ser carismático. Eu concluo dizendo que é um grande homem, é um homem integral, além de íntegro. (Palmas.)

Convido os Senhores presentes para que, em pé, junto com a Presidência, nos ajudem a fazer a entrega do título honorifico a Alejandro Lilienthal. (Lê o Diploma do Título.) Meus parabéns.

Ao encerrar a Sessão – acho que estou falando demais hoje, mas permitam-me mais dois minutos. É que hoje a imprensa de Porto Alegre comunica a descoberta de uma nova fonte de energia, que não é a desintegração do átomo, que causa a explosão, mas é a fusão do átomo, que causa a energia limpa, sem danos para a vida humana. Parece-me que Alejandro Lilienthal é um representante legítimo dos 4 mil anos dos essênios. E, depois de fricções de ambos os lados, os átomos da sociedade homena estão se unindo novamente em torno desse Congresso Latino-Americano de Congregações Judaicas Liberais, e quando o movimento é liberal, tem o objetivo, o sentido de melhorar como um todo. Parabéns, também, a esse Congresso Latino-Americano de Congregações Judaicas.

Estão encerrados os trabalhos da presente Sessão.

 

(Levanta-se a Sessão às 10h27min.)

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